Ohhhhh…
Escrevendo para profissionais de tecnologia que sempre que estão atrás de mais produtividade, eficiência e blá-blá-blá, sou capaz de levar pedradas ao atravessar a rua por colocar um título desses. Ou ser esfolado vivo (figuradamente, claro).
Tudo por que a automação é quase sinônimo de mais segurança, rapidez, perfeição etc.
Então qual o problema, Cohen?
Ui, Cohen não.
Quem diz isso é a Gretchen Gavett, editora sênior da Harvard Business Review.
Rá rá, segurou a baba de raiva, hein? Exato, teu problema não é comigo, é com ela. E convenhamos que pra Gretchen escrever algo assim e trabalhando onde trabalha, tem que ter embasamento (no mandato do presidente passado, diríamos “bala na agulha”).
O artigo dela é o How Self-Service Kiosks Are Changing Customer Behavior.
Artigo velhinho, de 2015, mas ainda atual. Mas pronto, já apareceu uma brecha pra você criticar e dizer que muita coisa mudou, só que não. O cotidiano prova isso.
A autora inicia falando sobre quiosques de autoatendimento.
Aahhhhhhhhh bom, Cohen. Daí são outros quinhentos. Só que não.
Deixa de ser apressado pra criticar e presta atenção, quem sabe tira alguns ensinamentos.
A automação tem vantagens comercialmente?
Sim, sim.
Usar autoatendimento para realizar compras online pode fazer com que o cliente compre mais.
(autoatendimento é automação, pois não há envolvimento humano por parte do fornecedor.)
Vamos pegar compra de vinhos online, por exemplo, comum hoje em dia no Brasil.
A fricção social que surge de ir a uma loja física e passar vexame por não entender nada do assunto (meu caso, mas não da minha jefa), ou de optar por líquidos nem tão chiques inexiste no ambiente online.
Ali onde tudo é automatizado, sem intervenção humana do outro lado, a gente compra o que quiser, quanto quiser etc. sem medo de passar vergonha.
Idem para pizzas.
Constrangedor ir num ambiente bacana e pedir uma muito barata. Ou cheia de gordura (o politicamente correto massacra tanto que logo pediremos somente pizzas veganas, para felicidades das novas gerações que optam por essa alimentação).
Online posso pedir pizzas com camadas duplas de queijo, bacon e todas as desgraça para a pança e o coração (e os bichinhos que tiveram que morrer para isso) sem constrangimentos.
Os quiosques também fazem upsell sem constrangimento. Sem ironia, mau humor ou ranço.
“Compre isso também.” “Leve aquilo que combina.” “Olha essa sobremesa.” Melhor ainda se conhecerem o histórico do comprador, haha.
Como diria meu genro: “- Te permite…”.
No ambiente de automação, sem a presença humana, é tranquilo.
Desvantagens
Mas não te entusiasma que o mundo pode ser diferente daquele maravilhoso que você propõe aos usuários. Ainda que abarrotado de boas intenções.
1. O cliente não enxerga o esforço feito nos “bastidores”
As operações de autoatendimento ficam tão fáceis de usar que o usuário nem imagina o puta tremendo trabalho que deu para entregar essa facilidade.
E por isso não enxerga valor, simples assim.
Já escrevi sobre tal paradoxo em Diariamente queremos pagar menos por competência e mais pela incompetência com os exemplos do chaveiro e do mecânico de carro ou navio.
E quando o cliente não consegue reparar nesse esforço, aprecia menos o serviço entregue e, como consequência, valoriza-o menos.
Antes de criticar o parágrafo anterior, leia esse artigo científico The Labor Illusion: How Operational Transparency Increases Perceived Value.
Amenizante para o caso acima? Mostre o que está fazendo…
Um site que compara passagens aéreas pode exibir rapidamente as empresas aéreas que estão sendo pesquisadas.
Veja o exemplo do app de farmácia: “Seu pedido está em aprovação“, “Seu pedido foi aprovado e está sendo pesquisado nas farmácias mais próximas“, “Seu pedido foi para separação“, “Seu pedido…” e assim por diante).
2. Autoatendimento precisa despertar interesse
Primeiro, o cliente precisa saber o que se espera dele.
Em segundo lugar, deve ser capaz de fazer o que se espera dele.
Vá num quiosque de autopagamento num supermercado e tente voltar uns passos. Verá que é uma desgraça. Pense em trocar a forma de pagamento. Grrr…
Finalmente, e onde muitas empresas saem dos trilhos segundo Gretchen, a pessoa precisa ver o valor de despender o esforço extra para que seja algo em que se envolva de bom grado.
3. A tecnologia carece de flexibilidade
Quando interagimos com alguém e não entendemos algo, esse alguém pode explicar de outra forma. E de uma terceira forma (mais que isso, somos burros mesmo).
Se estivermos tendo um mal-entendido, eles podem ajudar a esclarecê-lo. A tecnologia realmente não faz nenhuma dessas coisas.
4. Uma pessoa tem a capacidade de nos encantar (ou decepcionar, kkk)
É realmente difícil para uma tecnologia encantar, no entanto, porque ela é padronizada e construída sobre um conjunto de regras. Mas é possível que as tecnologias nos decepcionem.
Dá pra perder dinheiro oferecendo autoatendimento
Ixe, com essa migração maciça das empresas para chatbots burros, perdi as contas de quantos bancos e serviços online abandonei por não conseguir uma explicação para coisas básicas do tipo “O link para baixar o informe de rendimentos não baixa nada“, “o boleto está saindo com formato fora do padrão“, “Acesse o menu de nosso restaurante via QRCode” e por aí vai.
E se eu falasse do parquímetro de Nova Petrópolis/RS, bah!
Inicialmente, atender um cliente por meio de uma tecnologia de autoatendimento pode ser mais barato. Sensacional, faço tudo pelo app do banco.
Mas nem sempre é verdade.
Mas se tenho um problema, esbarro num chatbot pateta. Que me obriga a acionar o atendente, seja por telefone ou outro método.
E isso é mais caro para o negócio.
Se o banco tem agência, vou até ela (como quando quis fazer um PIX da entrada do meu carro e o sistema rejeitava, mas os limites estavam OK).
Tento central de atendimento, Consumidor.gov, Reclame.aqui e por aí vai.
Já sei, você dirá: ao menos não estamos atendendo tudo com um custo maior… Só que quando o sujeito chega a estes níveis, ele explode e chuta o balde!
Perguntaram pra Gretchen: a indústria de serviços está indo em uma direção muito mais automatizada?
Resposta dela:
Eu honestamente acho que não. A automação desempenhará um papel importante nas interações que podem ser transacionais e não relacionais — especialmente para interações otimizadas em velocidade e eficiência.
Mas somos animais profundamente sociais. E há muitas e muitas pesquisas comportamentais que mostram que as conexões sociais são importantes para nosso bem-estar e nossa saúde mental. Quando conversamos com as pessoas ficamos mais felizes.
Se você pensar nos lugares onde somos verdadeiramente leais, geralmente são lugares onde tivemos a oportunidade de desenvolver um relacionamento, certo? Então, quando você entrar em um Starbucks que frequenta, os baristas o conhecerão pelo nome e saberão qual bebida você deseja. Você se sente importante. Você se sente especial. O trabalho deles é mais significativo porque eles interagem com você. Sua transação é mais significativa, porque consegue interagir com eles.
Ah, Cohen, tudo é relativo.
Sim, o tempo que dura um minuto depende de que lado da porta do banheiro você está. Troque “porta do banheiro” por “automação” e opa, aí tudo muda. Ou não.
O que confirma a frase inicial 😀
Lembretes
Bebi gasolina azul. Nescau 2.0. Comi o espinafre do Popeye (já sei, nem sabem que é, haha).
Calendário cheio de eventos abertos (a jefa mandou atender a todo mundo) que são:
- Workshop de Gamification – para aqueles que desejam seduzir usuários e analistas de suporte a novas formas de agir (modalidade online).
- Curso Formação do Analista de Help Desk e Service Desk em Passo Fundo e em Porto Alegre.
- Curso Gestão de Serviços para Help Desk e Service Desk, presencial em São Paulo quanto na modalidade online.
Veja detalhes, preços etc. em www.4hd.com.br/calendario
E a Iria, por onde anda?
Desde quando uma musa pode sumir desse jeito? 🙁
Abrazon
EL CO