Hoje todos falam de XLA.
Quase se encerrando a pandemia (tomara, tomara!), quase se encerrando a guerra na Ucrânia (tomara, tomara!) agora os especialistas de internet se voltam para o XLA.
Não vou discorrer sobre isso, procure no buscador de sua preferência. Encontrará 1.001 papagaios do saber repetindo a mesma cantilena maçante.
O ser humano não toma decisões racionalmente
Se bem que pensa que toma. Isso é bom para a autoestima 🙂
Mas inúmeros cientistas sociais provaram que existem vieses cognitivos que influenciam a decisão e sabotam a racionalidade.
Dadas essas pesquisas, derivou da Psicologia Social um conceito denominado Economia Comportamental (Google aí).
Richard Thaler, Daniel Kahneman (psicólogo ganhador do Nobel de… Economia!) e Dan Ariely comprovaram isso cientificamente (foco no cientificamente).
Exemplo:
- Situação 1: compro um ingresso para o show do Jethro Tull por R$ 750. Nada me impedirá de ir ao mesmo, nem mesmo uma tempestade horrorosa.
- Situação 2: ganho o ingresso — mesmo valor — num concurso em site para o show. Se cair aquela tempestade horrorosa… Bem, talvez eu não arrisque minha vida em algum acidente no trajeto. Nem quero ficar gripado por assistir ao show debaixo d’água. E assim vai.
Quer saber: o ingresso continua sendo R$ 750. Se eu não for ao show em quaisquer das situações, perderei R$ 750. É uma questão racional.
Tá com tempo e interesse?
Visite o artigo do MIT Sloan Management Review:
Economia comportamental: a saga mental na tomada de decisão
MIT, pombas! Não é texto da Veja, Globo ou Pasquim.
Como manipular a experiência do usuário
É isso que você deseja saber.
O atendimento foi uma droga. Demorou pra caramba.
Mas ao final, o cliente foi atendido parcialmente e… Adivinha?
Ele sai feliz da vida! Sério mesmo.
Relato pessoal:
Compramos despacho de mala para ter direito a marcar assentos de ida e volta ao México. Súbito, a Copa Airlines troca nosso dia de volta para um dia depois. E perdemos os assentos de retorno. O atendente diz: “Sim, vocês podem remarcar os assentos, mas nesses que estão disponíveis aí”.
Óbvio que os assentos disponíveis eram uma m*.
Minha chefe ficou p. da vida e permaneceu 25 minutos ao telefone com o atendente. E seu supervisor. E finalmente marcaram dois lugares juntos numa posição na saída de emergência. Resumo da ópera?
Ela ficou feliz da vida com a interação por que tudo deu certo e não viajamos separados.
O enigma da experiência versus memória
Assista ao TED de 18 min de Daniel Kahneman.
Ele explica que existem dois eus: o da experiência e o da memória. E esse último praticamente é quem manda!
Nesse TED ele apresenta um estudo sobre colonoscopia. O grupo de pacientes A tinha, conforme o gráfico abaixo, pouco menos de 10 minutos de dores, encerrando com uma dor lacerante.
O grupo B tinha muito mais tempo de dor – mais de 20 min! Mas encerrava o exame com menos dor gradativamente.
Adivinha?
Aqueles que sofriam menos tempo, mas acabavam com um pico alto de dor ao final do procedimento davam altas notas de sofrimento para o exame.
O grupo B, apesar de ter sofrido muito mais, encerrou o exame com dor gradativamente menor, não acharam tão ruim.
Completamente irracional!
Isso se chama regra do pico-fim.
O eu da memória não lembra da experiência inteira. Somente dos picos.
E se o final for um pico de dor lacerante, é isso que recordará. O outro grupo, B, apesar de ter sofrido mais minutos, não encerrou o exame num pico e levou na boa.
Oi?!
Conclusão:
Pacientes preferem suportar procedimentos mais longos e desconfortáveis do que procedimentos dolorosos mais curtos.
E a manipulação, Cohen?
Vamos lá, extraído de How do our memories differ from our experiences?
Você quer receber uma nota boa na pesquisa de satisfação, ou pedir para o cliente recomendá-lo aos colegas, ou que ele lembre positivamente da sua empresa etc.
A regra do pico-fim também é usada pelas empresas para projetar melhores experiências para seus clientes e gerar vendas. Ao manipular as experiências do cliente e focar no desenvolvimento de a) picos de experiência e b) experiências finais positivas, os clientes tendem a relembrar do produto com mais carinho.
Exemplos de técnicas de pico de demanda e marketing incluem descontos surpresa no checkout ou fornecimento de pequenos presentes quando os clientes saem do estabelecimento.
Ao deixar uma última impressão boa, é mais provável que os clientes retornem e pensem bem do produto ou serviço.
Vamos exemplificar tal influência sobre a memória com um excerto de Understanding The Peak–end Rule & How It Affects Customer Experience:
Um cliente que foi roubado liga para dois bancos para cancelar seus cartões.
Quando liga para o primeiro banco:
- Ele espera aproximadamente 8 minutos na fila de chamadas antes de se conectar a um agente.
- Explica sua situação ao representante, o qual mostra empatia e cancela rapidamente seus cartões.
- O representante do call center vai além e pergunta ao cliente se ele se machucou, se precisa de uma ambulância ou da polícia.
- O representante agradece a escolha do banco e a ligação termina.
Quando o mesmo cliente liga para o segundo banco:
- Aguarda aproximadamente 3 minutos na fila de atendimento antes de ser atendido.
- Ele explica sua situação ao representante, o qual o transfere para o representante apropriado.
- O segundo representante ouve sua situação e cancela o cartão.
- Esse agradece a escolha do banco e a ligação termina.
De qual dessas duas interações você acha que o cliente se lembraria positivamente?
A ligação para o primeiro banco será lembrada de forma mais positiva, apesar do maior tempo de espera, porque o representante de serviço fez o cliente sentir que o banco realmente se importava com o que havia acontecido com ele. Isso ajudou a produzir um ponto final favorável para essa interação.
Neste mesmo artigo existem outras formas de lidar com a memória de experiência do cliente, criando picos favoráveis a você.
Um outro texto repleto de ilustrações pode ser lido em The Peak End Rule.
Então…
Funciona assim: se não tem tempo para quase nada, nem sei como leu esse artigo.
Esquece, hehe.
Se deseja aperfeiçoar seu centro de atendimento, pare de pensar somente em “melhores práticas” (você sabe bem ao quê estou me referindo), e trate de investigar a psicologia do ser humano.
Feito. Não vou sugerir exemplos.
Cada centro de suporte sabe como pode tornar, ao final, a experiência positiva para que o cliente fique feliz.
E sim, sim, existem contestações a tais teorias. A começar pela nossa cabeça pseudo-racional que rejeita a ideia e se retorce mais do que minhoca nas cinzas para aceitar tais conclusões. Mas os números comprovam.
Spoilers (palavra da moda)
Primeiro spoiler:
O curso presencial em Porto Alegre dia 05 de abril de Formação do Analista de Help Desk e Service Desk será sensacional. É um marco da retomada dos aprendizados presenciais e espero que possa ser replicado várias e várias vezes daqui por diante.
Segundo spoiler:
O curso online dia 27-28-29 de abril sobre Gestão de Serviços para Help Desk e Service Desk causará transtornos em muitos super técnicos que viraram coordenadores ou gerentes de suporte. Mas melhor agora no início da carreira do que lá adiante. É pra isso que o tio Cohen serve. Pra chacoalhar suas ideias e entregar o mapa, o roteiro de por onde ir.
Inscrições em https://www.4hd.com.br/calendario
Seja ligeiro como lebre morro abaixo por que as vagas… Esgotam-se antecipadamente.
Obviamente, quem não puder ir ao curso dos analistas, sempre pode encontrar conhecimento para treinar seu time em:
See you, friends.
EL CO