Gurus cometerem enganos não é um sacrilégio, nem motivo para crucificações.
Tal situação só mostra que também são humanos.
Em outubro de 2017 Ricardo Mansur escreveu um artigo com o provocativo título “Bob, a terceirização é uma solução ou um problema?“. Obviamente lê-se nas entrelinhas (ou até de forma escancarada) que ele é contra a terceirização de atividades.
Contudo, não no viés dos partidos de esquerda que desejam o aumento na quantidade de empregos, independente da produtividade e resultados. Ou da monopolização de atividades pelo Estado.
A visão do guru é outra: terceirizar certas áreas impede que a inteligência cresça e se desenvolva dentro do negócio terceirizado. Exemplo: se sou um funcionário de uma empresa que terceiriza um Service Desk, não tenho lá muito interesse pelo business core de quem está sendo terceirizado e por isso não fico atento às oportunidades de melhorias.
Pior: os prestadores do serviço, ao pagarem baixos salários, permitem que parte da cadeia produtiva descambe para a criminalidade – o exemplo dado cita a maldita clonagem de meu cartão de crédito.
O que não posso afirmar 100% que esse seja o pensamento de Mansur, pois o mesmo foi inteligente o suficiente para arquitetar um título enigmático para o artigo. Mais ainda – e por isso se trata de um guru – enfiou um ponto de interrogação ao final permitindo uma dúbia resposta positiva ou negativa.
Reflexão feita, não me impede de inferir, baseado no texto, os comentários acima expostos como a linha de raciocínio do mesmo.
OK, à réplica
Num evento HDI, lembro-me de uma palestra sobre um contrato entre Petrobras e Sonda Procworks. Essa última terceirizava o Service Desk da primeira e era avaliada em termos de indicadores de desempenho claramente definidos. Aliás, dependendo da sua produção poderia receber até bônus por metas realizadas. Entre os itens que angariavam tal premiação estava a regularidade na capacitação de funcionários.
Defeito onde moras? Ao final das contas, não é na atividade de terceirização.
E sim na qualidade do serviço prestado.
Aos fornecedores compete cobrar valores que consideram justo.
Não questionando se são “caros”, pois a quem compete decidir são os clientes e se acham o valor entregue adequado ou não. É por isso que existem no mercado corporativo de TI empresas como IBM e HP que não são o que podemos chamar de “acessíveis para qualquer um”. Porém entregam a qualidade combinada do serviço e uma confiabilidade muitas vezes vital.
Destarte (significa “assim posto”) é claro que muitos apelam para baixar preços. E às vezes a qualidade padece em função disso. Mas não é justo generalizar a terceirização mirando apenas os exemplos podres, esquecendo os bons.
A História
Seja dito de passagem que terceirização não é novidade. É um dos pilares da economia.
Imagine o sujeito que plantava trigo e trocava-o por ovelhas de outro sujeito. Por que não fazia tudo – plantar e criar – ao mesmo tempo? Por que o outro era um melhor criador de ovelhas e conseguia resultados mais satisfatórios.
Retroceda ao seu cotidiano: existem várias formas de terceirização que nunca chegou a pensar sobre elas:
- o lugar onde corta seu cabelo e/ou barba
- o jardineiro e síndico do prédio
- o designer gráfico
- até o cirurgião cardíaco (ou você quer fazer por conta própria a atividade dele?)
Informática também tem das suas:
Atualmente são raras as empresas que mantém seus próprios datacenters. Usam serviços do Google, da Microsoft, da Amazon, da IBM e outros provedores.
Terceirizaram.
Quando não se terceiriza, podem surgir situações que desequilibram a produtividade e, com isso, piores preços e desempenhos.
Pense nas questões que ocorrem hoje nos EUA: a ideia do governo em promover empregos às custas de altas tarifas alfandegárias impedindo o ingresso de produtos do exterior (China, China, China).
Tudo para gerar a curto prazo empregos.
Mas a médio prazo criará uma indústria incompetente e indolente.
Já vimos isso no passado: o governo brasileiro queria desenvolver a indústria de automóveis e computadores e criou reservas de mercado. O que vimos foi exatamente o descrito no parágrafo anterior e que nos obrigava a comprar produtos ruins e caros.
Por isso a terceirização.
Se existe alguém que faz algo melhor do que eu (lavar o prédio, por exemplo), por que não o contratar? Tanto faz se a forma for CLT, PJ ou assim por diante e se as demandas legais forem satisfeitas (e às vezes nem isso, pois serviços cloud são contratados no exterior e sem subordinação à lei nacional).
Os cabelos brancos
Arremetendo para a segunda marcha nesse andar.
Mansur apoia a ideia de estimular “cabelos brancos” no Service Desk. Já escrevi sobre isso em outro artigo. Mas é claro que tal missiva só agrega valor se os profissionais mais experientes forem COMPETENTES.
Novamente um conceito recorrente:
O que importa não é a terceirização, mas a qualidade e competência do serviço.
Os “cabeças brancas” (Mansur puxa brasa para seu assado, valendo-se do fato d’eu ser careca para me alijar destas oportunidades, já que temporariamente ele ainda possui cabelos e brancos) também só servem se forem competentes, caso contrário um jovem cheio de vigor e interesse poderá fazer o serviço melhor do que o sujeito mais interessado no netinho e nas férias que na atividade profissional.
Concluindo
Dear Mansur, poderíamos contestar os argumentos um do outro por uma semana inteira, desde que eu fosse rico o suficiente como o amigo para me ausentar do mercado.
Fornecedores de terceirização ruins serão aniquilados pelo mercado. Isso é o que você sempre fala, ainda que não nestas palavras. Se cobrar barato e não capacitar seus técnicos para alcançar um determinado lucro, será líquido e certo (salvo alguma inovação) que o contrato não será renovado. Vão precisar dormir de touca!
Salvo se o cliente for uma ameba incompetente. Daí o próprio negócio dele não escapará da bancarrota.
Como ainda sou obrigado a capinar diariamente (e o amigo foi mais inteligente nos negócios do que eu, por isso a sua capacidade de dispor deste rico recurso que é o tempo), resigno-me a articular minhas ideias neste blog.
Em outubro pago o almoço novamente.
Mas desta feita, abrirei mão do orgulho e deixarei pagar-me o café e ficarei oitavado no balcão!
Mas não na Ofner, lá não!
Abrazon
EL CO
PS: A gauchada tem um encontro comigo no Formação do Analista de Help Desk e Service Desk dia 31 de agosto em Porto Alegre. Quem não for, que não me venha chorar as pitangas por mais uma oportunidade.