Por que o desenvolvimento é geralmente mais valorizado que o suporte técnico?
É um lamento digno de romaria em Dia de Todos os Santos: por que o suporte não é tão valorizado quanto outras áreas de TI?
O principal argumento é que softwares e aplicativos tornam-se pouco a pouco commodities. Ou seja, quase todos vão ficando iguais.
Por outro lado, o atendimento é que faz o diferencial na manutenção ou não de um cliente, seja ele interno (sim, por que clientes internos também podem ser perdidos para a nuvem, prestadores de serviço, etc.) ou externo.
Qual é então a (minha) explicação?
Einstellung!
Exatamente.
Talvez seja a primeira vez na sua vida que se depara com essa expressão. OK, adicione ao seu vocabulário (alemão).
O gerente de suporte, como afirmei, é um babaca. Não, não vou ser mimoso se pretendo chacoalhá-lo. O fato é que está ao alcance de suas mãos dar um jeito nessa situação.
Aliás, não somente o gerente de suporte, mas qualquer coordenador que sinta inveja de outros colegas que são mais prestigiados pela diretoria que o próprio.
Einstellung
Em alemão significa “instalação”.
Em psicologia, de maneira simplificada, o “Efeito Einstellung” ocorre quando a primeira ideia que vem à mente, desencadeada por características familiares de um problema, impede que uma solução melhor seja encontrada. Isso afeta tanto pessoas que enfrentam problemas novos quanto especialistas. Ou seja, uma maneira de agir (ou de pensar?) encontra-se “instalada” no cérebro do sujeito.
Nem preciso registrar o quanto a devoção religiosa ao ITIL e outras metodologias impactam nesse conceito. O sujeito vira um autômato. E fica feliz e imagina-se supercompetente por oferecer “soluções de bate pronto”, hahaha.
Também se fala por aí de “entrincheiramento” ou “inflexibilidade dos experts”. Tem uma montanha de autores que exploraram o tema; pesquisei vários, mas o cerne é o mesmo e prefiro a expressão em alemão que é mais chique.
Exemplificando na cultura organizacional
Você não precisa sair da área de TI para reconhecê-la.
Veja adeptos de uma linguagem de programação. Com ela, conseguem fazer tudo, mas… Nem pensam que existem outras formas (e ferramentas) para produzir resultados ainda melhores. O fato é que o especialista se torna razoavelmente velhaco e enferrujado. Faz sempre o mesmo movimento, digo, pensamento.
Calma, eu vou matar a cobra e…
A expressão alemã também é chamada por “armadilha do sucesso”.
Vale ler o texto de Lisete Barlach em seu trabalho de doutorado denominado A criatividade humana sob a ótica do empreendedorismo inovador:
O paradoxo cultura—inovação nas organizações pode ser compreendido a partir do chamado efeito Einstellung (Kaufmann, 2004).
As pesquisas que o identificaram basearam-se no seguinte: 1) Indivíduos resolvem uma série de problemas de acordo com determinada fórmula; 2) a seguir, [esses indivíduos] são confrontados com uma tarefa ligeiramente desviante que pode ser solucionada de acordo com a velha fórmula, mas pode mais facilmente ser resolvida por meio de nova fórmula. [Um grande número de participantes nestes experimentos continuou a usar a velha e complicada fórmula, ao invés da nova, mais conveniente]; 3) um novo problema é apresentado que não pode ser resolvido com a fórmula padrão, mas é facilmente solucionado por meio de uma fórmula nova e simples. [Resultados mostram que um surpreendentemente grande número de pessoas não consegue resolver este problema simples em função da necessidade de acomodações na busca da solução].
A questão do efeito Einstellung remete à armadilha do sucesso nas organizações (Kaufmann, 2004), à valorização daquilo que deu certo no passado como predominante nas culturas organizacionais e as dificuldades para “pensar fora da caixa”, na terminologia de Bono (1990).
Então você vê por aí o dono de uma software-house incapaz de definir orçamento para os departamentos e querendo que venham fazer o beija-mão para pedir recursos, imaginando que não seriam maduros o suficiente para se autogerirem.
Ou A Kodak (vento mudou rápido de direção aqui no meu cérebro e recordou esse exemplo clássico) que pensou estar no ramo químico de produzir, vender e revelar rolos de filmes e nem percebeu que a câmera digital avançava no mercado. Aliás, inventada por ela mesma, haha.
Ou se mudarem a cor da grama, o boi…
Start-ups
Por que geralmente as novas empresas que revolucionam mercados (Easytaxi, Sympla, Facebook, etc.) são formadas, na maioria das vezes, por gente jovem?
Não é que possuem um jeito novo de pensar.
É que não possuem um jeito velho, hehe.
Conseguem fazer críticas e objeções à forma atual de se comportar, rejeitando os tradicionais “pés no chão”. E algumas vezes são criadas por gente pouco focada.
Opa, pouco focada, como assim?!
Modo difuso e focado
O fato é o seguinte: durante seu aprendizado ou quando precisa resolver um problema, é necessário entrar em modo focado. Você dedica atenção máxima a um assunto. É duro matar um problema e se concentrar nele se as distrações “borboleteiam” à sua volta. Uma mensagem de e-mail chega, um aviso sonoro no smartphone, uma interrupção de um colega, etc. e você já era.
Livros já comentaram sobre isso e o mais (?) recente é Foco do Goleman.
O modo difuso é quando você literalmente “viaja na maionese”.
Seu cérebro tem chances de realizar novas conexões; de trazer conhecimentos de outras áreas para trabalhar; de maneira inconsciente, sobre o tema.
Thomas Edison sesteava numa cadeira com esferas de metal. Quando pegava no sono, as esferas caíam no chão, acordando-o e ele conseguia recuperar pensamentos para aplicar numa solução. Salvador Dali fazia o mesmo com chaves na mão. Veja mais em Técnica para capturar ideias geniais do inconsciente.
Outros métodos são: o chuveiro (quem nunca teve uma boa ideia dentro dele?), ir tomar um cafezinho, beber chimarrão, correr ou até mesmo sair do ambiente para fumar (existem aqueles que enfrentando um problema complicado, vão até o térreo do prédio para fumar, desligando sua conexão consciente com o problema e quando voltam, voilà, estão com a solução).
Tá Cohen, e aí? Pode acabar a aula e chegar à explicação?
Muito bem.
Quem trabalha em desenvolvimento lida com inovação (seja lá o significado que você dá a essa expressão). Precisa encontrar soluções para as situações, mudanças de legislação, novas plataformas, etc.
O pessoal de suporte apenas mantém as coisas funcionando. Sim, até diagnostica e resolve problemas novos, mas…
O processo geral do suporte é velho. E os gestores, salvo raras exceções, perduram e mantêm esse esquema antiquado.
Ainda usam e-mails para criação de novos chamados (incidentes).
E-mails surgiram em 1980!
As redes sociais estão aí como plataforma gratuita (conforme o guru Mansur), possuem usabilidade instantânea por (quase) qualquer ser humano e… O pessoal do suporte manda preencher um formulário no portal?!
í€ la putcha, mas que entrincheiramento nos métodos antigos, hein?!
E como alternativa, constroem manuais para o usuário ler, quando ninguém mais faz isso: ler (exceto você, claro).
Na maioria das empresas que conheço ainda não fazem vídeos bem-humorados para ajudar na compreensão e autoajuda do que o usuário deve fazer. E desprezam todo o potencial dessa geração X, Y, Z que grassa nas áreas de suporte e que, com certeza, já fizeram milhões de vídeos caseiros. Qual…
Quanto mais uma equipe de suporte é homogênea e velha, pior a situação. Cria-se um hábito e ninguém aparece “contaminado” de novas ideias.
Esse é o valor negativo da experiência: ela blinda a penetração de novas proposições. E enfatiza a manutenção do atual.
Gestor de suporte, PELO AMOR DE DEUS E PELA NOSSA COMUNIDADE:
Pense. No modo difuso. Saia do habitual. Largue fora do conforto. Arrisque.
Encontre soluções novas para valorizar o departamento. Para aumentar a produtividade. Para abandonar coisas antigas. Para…
Utilize redes sociais. Abafe usando Business Intelligence (tome o exemplo da Amazon). Crie.
Largue de colocar tijolinhos na sua masmorra e vá caminhar na rua. Tomar um café no boteco da esquina. Um chope às 10 da manhã no shopping, assim que ele abrir.
Participar de um curso do Cohen (ah, você volta que é uma britadeira, por que eu chacoalho mesmo) e retorne com uma insuportável necessidade de fazer diferente.
Make it happens.
OK, vamos ao “crí¨me de la crí¨me”
Revista SupportWorld número 24 de julho e julho do HDI Brasil, André Miranda da Monsanto Brasil:
... resolvemos tomar uma ação arriscada para o momento, mas que traria o primeiro resultado: não ter SLA (o SLA existia no papel); o que importava era resolver os chamados tão logo fosse possível.
Chutaram o balde no mundo de métricas, controles de aperfeiçoamento de processos, definição de prioridades, blá-blá-blá.
E deu certo!
Pegaram um trator e esmigalharam o Einstellung!
Eu não estou recomendando que faça isso (abandonar SLAs, etc. e ainda usar como argumento esse artigo). Cada um tem seu momento.
Eles acharam que isso era a medida a ser feita. A solução para um problema que enfrentavam.
No seu caso, pode ser outra coisa.
Vá sestear depois do almoço
Well done. Eu dei meu recado. Mais direto impossível.
Go boy. Go girl. Conte-me novidades.
Abrazon pros guris, beijão nas minas.
EL Co
Excelentes dicas Cohen, obrigado!
Excelente artigo!
Vlw Cohen!
Woltter, o que aconteceu com tua barba, brother? Olho aqui ao lado do teu comentário uma face completamente lisinha, hahaha… Valeu.
Carlão, a gente vai se puxando por aqui, hehehehe… Mas gasta uma mufa pra concatenar as ideias que quase desisto, hoho.
Abrazon
EL CO
Este final deu uma chacoalhada em muito guru aÃ.. rss.. Discussão antiga! Eu sempre dizia e continuo dizendo que o SLA é a “cereja do bolo” de algo muito maior. Gostei do artigo.
Nos vemos no seu treinamento!
Einstellung! Ou… “QUICK WINS”
Grande abraço!
Gustavo Lens Minarelli
Prezado Bob,
Parabéns pelo texto. Eu senti falta dos vosso comentários sobre uma situação muito comum no Brasil. Muitos gestores (até mesmo presidentes) usam equações para resolver um problema que é incapaz de responder a necessidade imposta. Ou em outras palavras, muitos escolhem equações erradas e por causa disto nunca resolvem situações elementares. O caso citado da Monsanto Brasil é um destes exemplos clássicos. Uma breve análise nos números do desempenho da empresa nos últimos anos mostram como gestões ruins retiram valor de um negócio altamente lucrativo. Falar que o SLA só existe no papel é o mesmo que dizer que o mesmo não é real. A pergunta que não quer calar neste caso é o que foi feito do caminhão de dinheiro gasto para desenvolver estes SLAs. Tudo foi para o lixo? Eu não sou cerejeinho, mas sou boleiro. SLA nunca foi a cereja. Sempre foi e será o bolo. Até 2017 mais da metade dos gastos de TI não serão realizados pela organização de TIC. Os usuários perderam a paciência e fecharam o seu bolso para aqueles que são incapazes de falar e entregar promessas. Eu como sempre recomendo que os gestores de TIC fiquem do lado da bufunfa.
Interessante … e direto ao ponto – muito bom!